Pesquisar este blog

quarta-feira, 17 de março de 2010

O gordo em pauta.

Erlenia Sobral

Recentemente na cantina do ccsa, presenciei uma cena que me fez refletir, aliás, como tudo que acontece naquele prosaico café. As meninas da lanchonete questionando quase silenciosa e maldosamente as preferências de uma senhora gorda que como cidadã consumidora pagava sua torta de chocolate. Enquanto pessoa fora de forma e também fã da deliciosa guloseima, me incomodei e fiquei a pensar porque a obesidade dos outros preocupa tanto.
Não que eu não saiba que esta se configura como uma doença a ser superada. Pelo contrario, acho que necessariamente precisa ser tratada como tal. Não só pelo obeso e os médicos, mas também pelos magros que a percebem com um certo desconforto. Assim poupariam o gordo de duas coisas:1) do velho sentimento de culpa,tão próprio da sociedade ocidental e 2) de mais uma desculpa deste se refugiar em uma das poucas maravilhas desta vida que é comer.
Todo gordo já tentou superar sua condição, embora nem sempre admita que ela seja determinada pelo pãozinho a mais, seu corpo sempre sofre para uma tendência, sabe aquela velha frase: eu nem como tanto assim.... Não faltam revistas especializadas e já que perceberam que gordo gosta de consumir muito, tanto exploram sua doença como estimulam a superação da mesma.
Nas ditas revistas especializadas, o gordo é necessariamente alguém que tem alguma frustração e inveja do magro. Mas,segundo Luis Fernando Veríssimo( diga-se de passagem,um simpático gordo) o sentimento não se direciona a qualquer magro,mas ao come e não engorda.Pra ele,quem não gosta de comer nem é gente; o que desperta a inveja é aquele de metabolismo espetacular,aquele que come tudo e não engorda de ruim que é. Mas, gordo não pode ser ruim, portanto fica difícil emagrecer. Gordo tem que ser no mínimo simpático ou engraçadinho pra compensar o tanto de espaço que ocupa nas cadeiras de ônibus e no elevador.
Algumas pesquisas já mostram determinações genéticas e sociais desta doença. E é com certeza uma característica do nosso tempo de abundancia e muito controle remoto. Tempos em que caminhar não é mais uma condição natural e básica do ser humano. Mas, um privilegio da coragem de quem não se rendeu ou não tem acesso aos confortos, determinados pelas conquistas do desenvolvimento das forcas produtivas e suas contradições.
Vejam então que o gordo pode também ser contextualizado como uma vitima, tudo bem que não de todo passiva,haja vista sua boca nervosa.Mas,também não deveria incomodar tanto.Nem os regimes e as milhares de dietas deveriam ser os únicos ponto de pauta das conversas de todo mundo,inclusive de intelectuais; cadê o famoso hoje tá fazendo um calor não é?Observem que eu nem mencionei as exigências dos padrões de beleza anoréxica. Também dá pra substituir a pauta por assuntos mais lights como os espirituais. Só pra lembrar que gordos e magros tem outros atributos humanos para além de sua silhueta.
Mas, já que estamos numa sociedade tão atenta aos padrões de beleza, solicito que a indústria cosmética aperfeiçoe o mais urgente possível o botox pq não demora chego aos 40 e espero poder usá-lo, sem prejuízos da minha eterna vontade de rir da vida e de nós mesmos.

2 comentários:

  1. "Os gordos são os novos pretos"
    Eu sofro preconceito por ser simpatizante com a causa "Fat". Antes eu sofri preconceito por ter amigos gays, depois sofri preconceito por ter o cabelo grande e hoje sofro preconceito por ter uma afeição pelas "gordinhas". Como se fosse uma "série B" dentre as mulheres... Não vejo assim, aliás, talvez nem veja isso por olhar pro natural, pro espontâneo, pro verossímil... Nem sei, acho que ao justificar meu afeto pelas "gordices" femininas acabo legitimando o movimento que impõe o macérrimo como padrão.





    Ps- Hey, não ter diálogos em um texto é uma entrelinha para indiferença. Gostei do seu comentário. (Valeu um sorriso)

    ResponderExcluir
  2. ... indiferença na forma e conteúdo..ficou perfeito!

    ResponderExcluir